domingo, 27 de janeiro de 2008

Uma boa semana!!!

Iniciamos essa semana com duas publicações.

Logo abaixo, o texto de Arnaldo Luiz Dutra e Geraldo Antônio Reichert, Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos: A Coleta Seletiva e Seus Desafios. Reflexões a partir de uma experiência local.

Este, mostra o quanto a política pública pode contribuir para que as pessoas, no processo de reprodução de suas vidas, estabeleçam com o ambiente uma relação de respeito, optando no seu dia-a-dia por atitudes que repercutam positivamente na sua qualidade de vida e na do conjunto da sociedade. O texto aborda a experiência de Porto Alegre na coleta seletiva de resíduos, trazendo dados sobre os 15 anos dessa política da administração popular, que investiu em educação sócio-ambiental, equipamentos, unidades de triagem de resíduos, etc, Também aborda sobre questões ainda pendentes, como por exemplo, a coleta informal realizada por carrinheiros e/ou carroceiros e também questiona o FOCO das políticas, cuja centralidade está na reciclagem e não da redução de resíduos. Lança e responde a pergunta: QUAL É O PROBLEMA AFINAL?

O texto foi escrito há quatro anos. Hoje os autores ocupam outros espaços públicos. Arnaldo Dutra, Presidente da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento – ASSEMAE e coordenador do Consórcio Público de Saneamento Básico da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (Pró-Sinos). Geraldo Antônio Reichert, Engenheiro Civil, na Secretaria Municipal de Meio Ambiente – SMAM em Porto Alegre.

Bueno, o texto é muito mais, além de Atual, pedagógico e impulsionador.

O vídeo abaixo, "HERDEIRO DA PAMPA POBRE", que nos ajuda a refletir sobre as conseqüências para o nosso planeta da ausência de uma política de gerenciamento integrado de resíduos, foi uma indicação de Osvaldo Guadagnin. Alíás, uma feliz indicação deste que é engenheiro agrônomo da Emater atuando em Nova Bassano/RS e também Diretor do SEMAPI Sindicato.

Após o texto sobre resíduos apresentamos resumo e endereço do site da Emater onde é possível ler a íntegra da sistematização da experiência com Secador Solar, desenvolvido por Osvaldo Guadagnin. Osvaldo é vencedor do prêmio Responsabilidade Ambiental 2007, do Instituto Borboleta Azul e da Secretaria Estadual de Meio Ambiente.


Aproveitem.
Iara Borges Aragonez

Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos: A Coleta Seletiva e Seus Desafios. Reflexões a partir de uma experiência local




Texto abaixo de
Arnaldo Luiz Dutra e Geraldo Antônio Reichert

Nos últimos anos o conceito de gerenciamento integrado tem sido proposto como alternativa para a inversão da triste realidade do manejo dos resíduos sólidos urbanos no Brasil. Mas o que é gerenciamento integrado? Será que cada vez que usamos, lemos ou escutamos este termo temos todos o mesmo entendimento de seu significado? Nem sempre, pois mesmo algumas definições que têm sido propostas na bibliografia apre-sentam divergências. Talvez a definição que melhor resuma o que é gerenciamento integrado de resíduos sólidos urbanos seja aquela adotada por McDougall et al. (2001): o sistema de gerenciamento integrado engloba todo o fluxo de resíduos, os métodos de coleta, de tratamento e de destinação final, com o objetivo de alcançar benefí-cios ambientais, otimização econômica e aceitabilidade social (ou participação popular). Isto conduzirá a um sistema conveniente e sustentável de gerenciamento de resíduos para cada cidade ou região específicas.

Do ponto de vista do cidadão comum, o método mais conveniente de coleta provavelmente seja aquele que colete todos os resíduos misturados, tanto no que se refere ao tempo quanto ao espaço necessários. Este método limita, no entanto, as opções de tratamento subseqüente. A maioria dos métodos de tratamento requer uma segregação prévia na fonte em diferentes frações, dentro das casas, antes da coleta. A esta coleta de materiais previamente segregados é que chamamos de coleta seletiva.

A cidade de Porto Alegre, com cerca de 1,4 milhão de habitantes, conta com um programa de cole-ta seletiva desde 07 de julho de 1990. Contando hoje com a colaboração de parcela significativa da população porto-alegrense, que separa seus resíduos na fonte, ou seja, em suas casas, nestes 15 anos de coleta seletiva em Porto Alegre já foram recicladas cerca de 40 mil toneladas de papel, o que corresponde a 1,4 milhão de árvores que deixaram de ser derrubadas. Podemos dizer, portanto, que neste período, cada cidadão do município poupou exatamente uma árvore (1.400 mil habitantes). Além disso, temos ainda como benefícios diretos uma economia de 10 % do volume ocupado nos aterros sanitários (o que eqüivale a duração de mais 15 meses de vida útil dos aterros); e a geração de cerca de 600 postos de trabalho fixos e diretos nas Unidades de Triagem de Resíduos. Além disso estima-se que a economia de energia proporcionada pela reciclagem, somente de alumínio e papel, neste período seja de 9 milhões kWh, o que é suficiente para manter o consumo de energia elétrica de 5.000 residências (20 mil habitantes) por um período de um ano.

A educação ambiental é ferramenta, porque é através dela que se busca a conscientização das pes-soas para que façam a efetiva separação de seus resíduos em suas residências; e é produto porque ao fazerem esta segregação em suas casas ou escritórios, as pessoas entram em um processo de “dar-se conta” de toda a dinâmica de geração e tratamento dos resíduos. É portanto um processo que é continuamente retroalimentado, o que é aliás característica intrínseca de um “sistema”.

É sabido que soluções sozinhas e estanques não conseguem resolver os problemas no gerencia-mento de resíduos sólidos. As alternativas devem ser vistas e concebidas com uma visão sistêmica, sempre como sendo parte da solução, e não a solução. A coleta seletiva é apresentada como uma das alternativas de grande impacto. Solução que obrigatoriamente é precedida da educação ambiental e sócio - ambiental, devido a potencialidade de geração de renda, e vem acompanhada de unidades de triagem dos materiais, centrais de comercialização, reaproveitamento e reciclagem propriamente ditas, não fugindo da necessidade de unidade de destinação final para aquela fração não reciclável.

A coleta seletiva, agregada às unidade de triagem de resíduos, teve seu crescimento no Brasil mais acentuado na década de 1990. Quando estas alternativas são concebidas como sendo partes integrantes de um sistema integrado, são com certeza elementos fundamentais na definição de modelos sustentáveis de gerencia-mento de resíduos. Os benefícios também são visíveis, como atestam os números e os resultados já apresentados anteriormente para o município de Porto Alegre.

Mas, parafraseando livremente o poeta, nem tudo são frutos nem flores. Todos as cidades brasilei-ras, independentemente do seu tamanho ou do grau de desenvolvimento econômico, estão atualmente sendo desafiadas a resolver a questão da coleta informal, isto é, aquela coleta que é feita por catadores de rua por meio de carrinhos de tração humana (os carrinheiros), por carroças de tração animal (os carroceiros), por veículos automotores adaptados, e até mesmo por pessoas de bicicleta, a pé e empurrando os carrinhos de supermercado. Estima-se que em Porto Alegre o número de catadores informais de rua tenha subido de cerca 1,5 mil a algo em torno de 5 ou 6 mil nos últimos 4 anos. Este fenômeno deve-se a dois fatores preponderantes: a forte crise econômica de um lado, que mantém excluídos do mercado de trabalho milhões de brasileiros; e de outro lado a disponibilização de renda junto ao meio-fio. Sim, porque é isto que estamos fazendo quando separamos os resí-duos em nossas residências e os apresentamos à coleta seletiva. Como nos dizia, em recente debate em um pro-grama de rádio local, uma ex-catadora que catava na rua para poder pagar seu curso numa universidade privada (ela faz Serviço Social): “quando eu vejo um latinha ou papel na rua, eu não vejo outra coisa senão moedas.”

Cabe ao poder público, e toda a sociedade, dar resposta a esta grave questão de milhares de pesso-as que sobrevivem destas atividades informais. Esta coleta informal, nos moldes em que ela vem sendo feita na maioria das cidades brasileiras, acaba trazendo uma séries de conflitos com o sistema de limpeza urbana oficial – uma vez que muitas vezes os resíduos são triados em plena via pública, resultando em prejuízos à limpeza pública – e com as associações de catadores formais estabelecidas nas Unidades de Triagem – uma vez que há uma competição pelo material disponível, competição esta muitas vezes “desleal”, pois os catadores de rua acabam retirando os materiais mais nobres, o que resulta em queda de rendimentos financeiros para as associações esta-belecidas. Além disso, pode representar inconvenientes sanitários, pois os locais onde é feito o armazenamento, beneficiamento e comercialização dos materiais coletados geralmente apresentam condições de salubridade longe do desejável.

A política de resíduos sólidos a ser implementada pelos município deve levar em conta esta reali-dade. Entretanto, não cremos que a forma mais inteligente de procurar resolver o problema seja incentivando esta catação informal, ou querer que os catadores de rua assumam a coleta seletiva. Os catadores devem ser con-siderados parte integrante na definição do sistema integrado de gerenciamento. Tanto na fase de definição, quanto na fase de implementação (implantação e operacionalização). Mas no nosso ponto de vista, o sistema deve ser concebido para que a catação de rua, ou a coleta informal, seja gradativamente abandonada, substituída e desnecessária.

Talvez nesta questão, de catadores e do incentivo à coleta informal, resida uma das maiores contradições no que tange ao gerenciamento de resíduos sólidos. Focamos o problema e não a solução. Esta questão de foco nos faz lembrar de uma historinha: “Quando a Nasa iniciou o programa de lançamento de foguetes tripu-lados nas décadas de 1960, descobriram que as canetas não funcionariam com gravidade zero. Para resolver este enorme problema, contrataram uma grande empresa de consultoria. Empregaram uma década de pesquisa e 12 milhões de dólares. Conseguiram desenvolver uma caneta que escrevesse com gravidade zero, de ponta cabeça, debaixo d'água, em praticamente qualquer superfície incluindo cristal e em variações de temperatura desde abai-xo de zero até mais de 300 graus Celsius. Os russos, por sua vez, usaram um lápis...”

É senso comum que a política dos 3 R´s (Reduzir, Reaproveitar, Reciclar) deva estar presente em qualquer modelo. A hierarquização das ações prioritárias num sistema integrado, diz que primeiro devemos reduzir a geração dos resíduos; depois, o que não for possível evitar que seja gerado, devemos reaproveitar; somente depois é que vem a reciclagem (e aí esta subentendido tanto a reciclagem dos materiais ditos “secos” como a reciclagem da matéria orgânica). Na seqüência hierárquica ainda vem o tratamento térmico e o aterro sanitário. No Brasil, ocorre uma inversão de prioridades: a reciclagem tem sido muito incentivada – e isto é bom –, mas o primeiro R tem sido completamente esquecido – e isto não é nada bom. É aí, nesta inversão de prioridades, que está a contradição.

Deveríamos estar focando nossos principais esforços em políticas, projetos e atividades de não geração de resíduos; sendo as demais atividades – reaproveitamento/reciclagem, tratamento e destinação final – complementares. Qual é o problema afinal? Uma boa tentativa de resposta a esta pergunta é dizer que o proble-ma é a geração de resíduos. São os resíduos que causam os impactos ambientais quando tratados e dispostos de forma inadequada, ou mesmo quando o são de forma adequada (é por isso que fazemos os estudos de impacto ambiental para unidade de compostagem ou aterros sanitários, para identificar, quantificar e mitigar estes impac-tos). Ora, se os resíduos são o problema, não é focando-os que vamos resolver o problema, mas sim focando a solução, qual seja, a sua não geração.

A contradição está também na própria visão que os catadores têm do problema: para eles quanto mais resíduos, melhor, pois mais rendimentos eles conseguem. Contradição esta que também tem sido explorada por aqueles que teriam um papel fundamental na minimização da geração dos resíduos: os fabricantes de emba-lagens e os que as utilizam para vender seus produtos. Vejamos um exemplo muito ilustrativo disto. Há um tem-po atrás, um fabricante de envases para bebidas patrocinava campanhas e gincanas em colégios de educação fundamental e de ensino médio, onde as crianças ou adolescentes eram incentivados a levar para a escola estes envases vazios. Em troca, as turmas que conseguiam juntar o maior volume destes materiais, recebiam presentes, como computadores ou outros equipamentos. Num primeiro olhar parece uma troca vantajosa – assim como pareceu vantajosa aos indígenas, 500 anos atrás, a troca de seu ouro por espelhos e quilharias –, no entanto este tipo de campanha elevou em muito o consumo das bebidas envasadas no referido material no bar daquele colégio. O mesmo vale para outros materiais, por exemplo, o caso em que crianças levaram para campanhas de reci-clagem feitas no colégio maços fechados de papel para impressão. Isto pode ser tudo, menos campanha de educação ambiental ou correto gerenciamento de resíduos.

Por fim, é importante não nos esquecermos, quando falamos de coleta seletiva e de reciclagem, da fração orgânica. Matéria orgânica representa em média de 50 a 60% em peso dos resíduos sólidos domiciliares no Brasil. Estima-se que a fração recuperada, através do processo conhecido como compostagem, é menor que 1%. O investimento em compostagem merece um olhar mais cuidadoso, pois é capaz de desviar do aterro sanitá-rio um percentual de 2 a 3 vezes maior que a reciclagem dos outros materiais. Juntos, reciclagem de materiais (ditos “secos”) e orgânicos, podem desviar em torno de 75% do aterro, ou seja, sobrariam os cerca de 25% que representam os rejeitos sem possibilidade de utilização.

Certamente não conseguiremos atingir a geração zero de resíduos num curto espaço de tempo (tal-vez nem num médio). Enquanto isto, devemos adotar todas as possibilidades dentro da hierarquia de ações pos-síveis. Nestas etapas, os catadores não podem ser simplesmente esquecidos ou excluídos. Mas, achamos que este deva ser um processo de transição, em que novas alternativas sejam buscadas, e que cada vez menos resíduos sejam gerados.

Não vislumbramos um futuro onde o homem esteja puxando um carrinho para poder sustentar sua família, nem um futuro onde o homem explore outros homens que fazem a coleta informal de resíduos pelas ruas das nossas cidades.
Nós cremos num futuro de cidadania plena... Nos permitamos a todos esta utopia!

Bibliografia citada:
McDougall, F.; White, P.; Franke, M; Hindle, P. 2001. Integrated solid waste management: a life cycle inventory. Blackwell Science: Oxford. 513p.

SECAGEM DE GRÃOS COM ENERGIA SOLAR (NOVA BASSANO)

Experiência realizada na propriedade
do senhor Adilson Peruzzo
Osvaldo Guadagnin Nova Bassano/

RESUMO
A experiência refere-se a um secador de grãos que utiliza energia solar como fonte de fornecimento de calor, instalado nos meses de março e abril do ano de 2002, na propriedade do senhor Adilson Peruzzo, comunidade de Tredezeta, município de Nova Bassano. Trata-se de um secador de leito fixo modificado em que a fornalha é substituída por túneis plásticos baixos com a função de aquecer o ar, que posteriormente é impulsionado por ventiladores em direção a massa de grãos. As vantagens do secador de grãos solar são: a eliminação do uso de lenha para a secagem; o baixo custo de implantação, operação e secagem; a dispensa de mão-de-obra durante o processo de secagem; e a qualidade dos grãos. O secador tem capacidade de secagem para 400 sacos por vez e pode ser usado no beneficiamento de qualquer tipo de grão. A única desvantagem é que o tempo de secagem é cerca de cinco vezes maior que o tempo em secador a lenha.

http://www.emater.tche.br/site/inicial/ptbr/php/index.php (buscar em Sistematização de Experiências)

domingo, 20 de janeiro de 2008

Coletivo Desenvolvimento Sustentável conversa com organizações comprometidas com a SUSTENTABILIDADE DO DESENVOLVIMENTO

O Coletivo Desenvolvimento Sustentável do Semapi – CDS Semapi, representado pelos diretores que integram a Diretoria Executiva do Sindicato - Antenor Pacheco, Paulo Sérgio Mendes Filho e Iara Borges Aragonez - reuniu-se na sexta-feira última, com João Rockett, Diretor do IPEP – Instituto de Permacultura e Ecovilas da Pampa. Participou também da reunião o representante do Setor Privado no Semapi, o Diretor Daniel Soares.

Esta reunião deu seqüência a um conjunto de articulações, visando recolher o máximo de informações e identificar parcerias que possam contribuir para uma melhor execução da ação do Coletivo a partir de Março/2008.

Na semana passada estivemos reunidos com Arnaldo Dutra, ex-diretor do DMLU/Porto Alegre, atual presidente da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento – ASSEMAE e coordenador do Consórcio Público de Saneamento Básico da Bacia Hidrográfica do Rio dos Sinos (Pró-Sinos).

Nos dois casos, identificamos grandes possibilidades de contribuição.

Cabe dizer que o CDS Semapi, assim como os demais coletivos do Sindicato, possui um planejamento estratégico que organiza a sua ação a partir de grandes eixos. Dentre eles, destaca-se aqui dois, os quais são fundamentais, por seu caráter estratégico e estruturante.

Um deles, “Consumo e Sustentabilidade”, prevê incidirmos nas práticas cotidianas de consumo, sejam elas dentro do sindicato ou na sua base. E, considerando que essas práticas são fortemente enraizadas, pois, constituídas a partir de valores historicamente introjetados na sociedade, prevemos o eixo “Formação e Capacitação”. Este eixo dará maior consistência para o enfrentamento necessário, garantindo ações formativas capazes de provocar a reflexão e de desenvolver uma consciência crítica sobre o papel que determinadas práticas cumprem para a degradação humana e ambiental, e, o quanto, mesmo que inconscientemente, contribuímos para o estado atual das coisas.

Perseguimos, demarcados por esses dois eixos, as condições para promover a re-significação do ato cotidiano de consumir, necessária para a adoção de novas práticas de consumo e para a construção de uma sociedade mais justa. O que impulsiona e anima a ação do Coletivo é a sua convicção quanto à perversidade do modelo vigente, tanto para a sociedade quanto para o ambiente natural e quanto a importância de organizações sociais e políticas, como sindicatos, contribuírem para a construção de um modelo de desenvolvimento que se organize a partir de outra lógica. Dada à força do "adversário", sabemos que apenas a informação consistente, a denúncia sistemática e o seu enfrentamento com ações concretas, que propiciem mudanças concretas, são capazes de incidir em práticas consagradas e de contribuir para a efetiva materialização de um outro paradigma de desenvolvimento, orientado por princípios e valores comprometidos com a justiça social, a eqüidade e a preservação ambiental.

Quando falamos de consumo, estamos falando tanto do consumo de energia, quanto de alimentos e de insumos. Neste último caso, nos referimos a matéria – prima utilizada em processos produtivos e também aos materiais utilizados por instituições para dar conta das suas atividades diárias, como papéis, tintas, utensílios, etc.

A conversa reafirmou que as duas organizações têm muito a contribuir para o processo formativo que queremos estabelecer.

O João, com a visão sistêmica de como cuidar da Terra e da Vida, representada pela PERMACULTURA, poderá nos propiciar uma reflexão sobre sistemas integrados de plantas, animais, água, edificações, energia natural e a relação do consumo nessa cadeia, ajudando-nos a reflexionar sobre como podemos nos valer desses ensinamentos para o nosso bem viver. E o Arnaldo com todo o seu acúmulo e experiência acerca do impacto ambiental dos resíduos, nos mostrando como a triagem e a correta destinação, podem elevar a nossa qualidade de vida e a de populações excluídas. REDUZIR, REUTILIZAR e RECICLAR, a política dos 3Rs, assim como, garantir a destinação social dos resíduos, são alguns dos caminhos já apontados.

Abaixo, publico um texto do IPEP, que estou retirando do Caderno de Orientações que elaboramos em 2005 para a execução do Programa Quilombolas Em Rede, aqui no RS.

Antes de Fevereiro, inaugurando a entrada no Blog de temas relacionados a gestão ambiental, relacionada a resíduos sólidos, estarei publicando o texto Gerenciamento Integrado de Resíduos Sólidos: A Coleta Seletiva e Seus Desafios. Reflexões a partir de uma experiência local, de Arnaldo Luiz Dutra e Geraldo Antônio Reichert.

A foto que acompanha o texto do IPEP é do mesmo período do Caderno de onde o recorto. O reencontro com o João me fez mexer nesse arquivo e não resisti em mostrar uma delas. Faz parte de um tempo que se foi, mas que deixou muitas coisas boas com fortes marcas. Dentre elas, essa ponte com o IPEP, que, como sempre, traz boas novas e abre novas perspectivas.

Iara Borges Aragonez
Boa Leitura!!!

Permacultura



A palavra Permacultura não existe no dicionário, vem da união das palavras permanente e agricultura ou cultura. É um sistema de desenho aplicado, interdisciplinar, para criar comunidades humanas sustentáveis, paisagens cultivadas e outros sistemas de apoio, com uma visão generalista, que contribua neste processo. Sua metodologia é baseada em princípios ecológicos, para produzir um sistema integrado de plantas, animais, água, edificações e energia natural. A Permacultura é um sistema de cuidar do Planeta Terra, que tem suas raízes em uma filosofia de abundância.

Histórico da Permacultura
Bill Mollison cresceu em uma pequena vila na Tasmânia. Tudo o que precisavam faziam, seus artefatos, seus calçados. Pescavam seus próprios peixes, produziam sua comida e faziam seu pão. E não conhecia ninguém nesse lugar que tivesse um só trabalho, ou qualquer coisa que pudesse ser definida como emprego. Todos trabalhavam em várias coisas. Até os 28 anos de idade vivia uma espécie de sonho, passando a maior parte do tempo no mato ou no mar. Mais tarde em 1968, começou a ensinar na Universidade da Tasmânia (Austrália) e, em 1974, com David Holmgrem, desenvolveu uma estrutura de trabalho para um sistema de agricultura sustentável, baseado na policultura de árvores perenes, arbustos, ervas, vegetais, fungos e tubérculos, para o qual criou a palavra Permacultura.

Principal ensinamento
Assumir responsabilidade pessoal pela nossa vida e pelos nossos atos. Verificar sempre o impacto que nossas ações de hoje podem gerar em um futuro próximo, no ambiente em que vivemos, assim repensarmos as ações com relação a alimentação, consumo em excesso, luxo...etc.

As 3 éticas da Permacultura


. Cuidado com a terra
Concepção de Planeta reconhecendo suas limitações, mantendo os sistemas vivos, se responsabilizando por eles ; consciência e responsabilidade com o Planeta, minimizando nosso impacto. Ter a consciência de que os recursos são limitados, o que não pode
ser limitado é nossa capacidade de criar e de amar.

. Cuidado com as pessoas
A qualidade da vida humana é um fator essencial no desenvolvimento de estratégias de sobrevivência. Nós somos responsáveis pelo bem estar uns dos outros. Na natureza as espécies na sua interação cooperam mais do que competem. Cooperação é diferente de competição. A globalização torna a competição uma religião.

. Partilhar excedentes
O excesso de bens é antiético e imoral, quando concentrado nas mãos de poucos;
Quando existir o excedente está na hora de rever o sistema. Qualquer pessoa, instituição ou nação que acumule riqueza ao custo do empobrecimento de outras está diminuindo a expectativa de sustentabilidade da sociedade humana.

Limites ao consumo
Isso requer um repensar de valores, um replanejamento dos nossos hábitos e uma
redefinição dos nossos conceitos de qualidade de vida. Alimento saudável, água limpa e abrigo existem em abundância na natureza; basta que com ela cooperemos.

Entendendo os sistemas naturais.
Sustentabilidade é regida por leis, que mantém os sistemas naturais. O sistema sustentável é aquele que armazena, retém e acumula energia. Quanto mais energia retém MAIS o sistema é sustentável. . Ex: a floresta é um sistema natural que melhor utiliza a energia e que tem um maior número de pontos de armazenamento. . MAIS sustentabilidade = MAIS energia armazenada.

Características da sustentabilidade. regras de sustentação.
. Produzir suas necessidades e das pessoas; Armazenar mais energia do que a utilizada
para construí-lo.

Poluição
Poluição é a consequência de um produto não utilizado por nenhum outro elemento; é superabundância de recursos. O aumento de trabalho surge quando existe uma deficiência de recursos, quando um elemento no sistema não agrega outros elementos úteis, quando não existe interligação entre os elementos e entre as funções.

Princípios da permacultura
. Trabalhe com a natureza e não contra; Todo o problema tem sua própria solução; . Mínimo de mudança para o máximo beneficio; . A produtividade só é limitada pela imaginação;

Conceitos básicos
. Principio do caos, da desordem. excesso de energia acumulada gera um caos no sistema. Ex: excesso de chuva transborda os açudes.
. Quando se coloca energia além da capacidade do sistema.
. Produtividade é a soma total da energia produzida, armazenada e reciclada em um sistema.
.Seleção de espécie de múltiplo uso;
.Seleção de espécies que possam se autoarmazenar. Ex: mandioca, técnicas de armazenamento; conservas, desidratação de alimentos;
. Economia micro regional.
. Criação de ciclos na propriedade. Ex: biodigestor para efluentes líquidos e sólidos.
. Compreensão dos nichos: no tempo e no espaço.
. Stress: funcionamento forçado de um elemento, de um sistema; impedimento do funcionamento natural e harmônico.
. Estabilidade, equilíbrio - é uma função do tempo e diversidade.

Design - É um processo continuo de informação, de aplicação da informação, de feedback e realimentação: é cíclico e deve ser constantemente reavaliado.
No design é importante observar a inter-relação entre os elementos e suas funções dentro do sistema.
Leis básicas do design permacultural: cada elemento deve ter muitas funções, cada função essencial deve ser coberta por muitos elementos. Quanto mais completo o sistema maior a funcionalidade.
A sociedade é de uma maneira geral presa pelos valores da estética, e a permacultura pela funcionalidade (é o foco do desing permacultural). A permacultura trabalha com várias áreas do conhecimento: bioconstrução, geração de energia renovável e de baixo custo, produção de alimentos limpos, e água, dentro de uma visão que denominamos segurança hídrica, promovendo um desenho que una harmonicamente estes elementos. Este é o desafio de quem trabalha com permacultura.

Para pensar
“ Devemos mudar nossa filosofia, antes que qualquer outra coisa mude. Mudar a filosofia da competição (a qual, hoje, penetra nosso sistema educacional) para a filosofia de cooperação, em associações livres. Mudar nossa insegurança material para uma humanidade segura; trocar o indivíduo pela tribo; petróleo por calorias e dinheiro por produtos. A grande mudança que necessitamos fazer é do consumo para produção, mesmo que em pequena escala, em nossos próprios quintais. Se 10% de nós fizéssemos isso, haveria o suficiente para todos. Assim, vê-se a futilidade dos revolucionários que não têm jardins, que dependem do próprio sistema que atacam, que produzem palavras e balas e não alimento e abrigo. Algumas vezes, parece que somos apanhados, todos nós, na Terra, em uma conspiração consciente ou inconsciente para nos mantermos sem esperança. E, mesmo assim, são pessoas que produzem todas as necessidades de outras pessoas, juntos podemos sobreviver. Nós mesmos podemos curar a fome, toda a injustiça e toda a estupidez do mundo. Podemos fazê-lo compreendendo a forma com que funcionam os sistemas naturais, pelo reflorestamento e jardinagem cuidadosos, pela contemplação e cuidado com a Terra.”
Bill Mollison

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Agricultura familiar e Consumo de Agrotóxico

Estamos publicando abaixo, texto do Engenheiro Agrônomo Lauro Bernardi, trabalhador da Emater/RS - Ascar, em Santa Clara do Sul. ESP em Biologia, com ênfase em Gestão e Planejamento Ambiental, Lauro, atualmente é, também, Diretor do SEMAPI Sindicato e integrante do Coletivo Desenvolvimento Sustentável.

Cabe destacar que o texto “Agricultura familiar e Consumo de Agrotóxicos”, é uma sistematização de estudo realizado em 2003, junto à famílias de agricultores do município de Imigrante. Em que pese o tempo transcorrido, o tema continua sendo muito atual e as informações nele contidas, relevantes para aqueles que se dedicam a temática “sustentabilidade”.

Boa leitura.
Iara Borges Aragonez.

BERNARDI, L.E.

Agricultura familiar e Consumo de Agrotóxico
Imigrante, maio de 2004
Escritório Municipal da Emater/RS-Ascar
Escritório Regional de Estrela

Resumo
Para conhecer e avaliar a realidade do uso e do cuidado que o usuário de agrotóxicos dispensa a si próprio, a Emater/RS-Ascar realizou durante o mês de março de 2003, investigação junto a 33 famílias de agricultoras do município de Imigrante. Os resultados indicam que 91% das propriedades utilizam agrotóxicos, sendo 76% aplicados através de pulverizadores costais. Das propriedades envolvidas, 94% declararam não possuir equipamento de proteção individual adequado para aplicação destes agroquímicos. Nunca ao longo da sua história pequena propriedade familiar utilizou tanto agrotóxico sem a mínima proteção individual, evidenciando o desconhecimento dos riscos à saúde e a falha nos mecanismos educativos utilizados.

Palavra chave
Agrotóxicos, agricultura familiar e saúde.

Contexto
Imigrante, localizado no Vale do Taquari compõem-se por uma população de pouco mais de 3.000 habitantes basicamente descendentes de alemães (70%) e italianos (30%), que em 1988 constituíram município emancipando-se de Estrela e Garibaldi. Com topografia acidentada, baixa mecanização e progressivo envelhecimento da mão-de-obra ativa do meio rural, a agricultura familiar atual de Imigrante assenta-se sobre o cultivo do milho, produção leiteira, suinocultura, terminação de frango, fruticultura e cultivos diversos de subsistência. As doze comunidades rurais mantêm sua organização característica no entorno da capela e salão comunitário. Cada comunidade possui representação no Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural e, onze comunidades possuem grupos organizados de mulheres que sistematicamente reúnem-se com apoio da extensão rural para debater e aprofundar temas de interesse anualmente planejados.

Assim, a partir da demanda de três grupos de mulheres rurais organizadas do município, para que a equipe da Emater/RS-Ascar realizasse uma reunião sobre os efeitos dos agrotóxicos sobre o organismo humano, é que se desenvolveu o trabalho objeto da presente sistematização.

Descrição da experiência
A presente investigação realizou-se durante o mês de março de 2003, junto às comunidades de Ernesto Alves, Boa Vista 37 e Imhoff frente, no município de Imigrante. Através de reuniões com três grupos organizados de mulheres trabalhadoras rurais (Agricultoras Sempre Unidas, Girassol e Flor da Primavera), realizou-se um trabalho de sensibilização sobre a realidade dos agrotóxicos e seus efeitos sobre o organismo humano.

“O Brasil encontra-se entre os maiores consumidores de agroquímicos do mundo, tanto aqueles de uso agrícola como os domésticos e os utilizados em Campanhas de Saúde Pública”. Em 1999, isso representava 7% do consumo mundial.

Dada a falta de controle no uso destas substâncias químicas tóxicas e o desconhecimento geral sobre os riscos e perigos à saúde daí decorrentes, estima-se que as taxas de intoxicação humana no país sejam altas. Segundo a Organização Mundial da Saúde para cada caso notificado de intoxicação, ter-se-ia 50 outros não notificados. A Fiocruz/ Sinitox informa que em 1993 foram notificados no país 6000 casos de intoxicação por praguicidas, que corresponderiam estimadamente a 300.000 casos de intoxicação naquele ano. Desta forma, é seguro afirmar que o evento intoxicação e as doenças daí decorrentes constituem-se em um grave problema de saúde pública, caracterizando-se como endemia.

Quando se fala em toxidade de uma substância, limitamo-nos muitas vezes embora erradamente, a considerar os efeitos mais rápidos que sua penetração no organismo provoca. Entre estes efeitos o mais grave, evidentemente é a morte. Na realidade os efeitos tóxicos também provem do consumo ou exposição a doses pequenas para provocar intoxicação aguda, mas cuja repetição acaba por originar efeitos mais graves. Basicamente podemos classificar os efeitos dos agrotóxicos em agudos e crônicos, sendo estes últimos ainda pouco pesquisados. Há pelo menos 50 agrotóxicos no mercado que são potencialmente carcinogênicos para o ser humano. Outros efeitos são neurotoxidade retardada, lesões no sistema nervoso central, redução de fertilidade, reações alérgicas, evidências de mutagenicidade, lesões no fígado, efeitos teratogênicos entre outros.

A propaganda das empresas que comercializam agrotóxicos centraliza seu foco na eficiência do produto para este ou aquele fim, orientando em minúsculas letras para os cuidados durante a manipulação e a aplicação. “Entretanto, nunca alertam para os riscos potenciais, como, por exemplo, ocorre na comercialização do cigarro.”

Tendo claro que a preocupação com a saúde familiar é mais feminina, formularam-se no final do trabalho questões orientadoras buscando conhecer e analisar a realidade atual de uso e do cuidado que o usuário de agrotóxicos dispensa a si próprio. O universo envolvido no trabalho foi de 33 famílias, o que representa uma amostra aleatória de 5,5% das famílias rurais do município.

Resultados
Ao questionamento de quantas propriedades utilizam agrotóxicos, 91% das entrevistadas responderam que utilizam principalmente herbicida para implantação das lavouras de milho. A dose média por hectare fica à ordem de 7 litros, sendo dois litros de dessecante especialmente a base de glifosato e 5 litros de pré-emergentes.

Em recente revisão bibliográfica na literatura internacional, CLARO e PAGANELLA investigaram os efeitos do glifosato sobre a saúde humana, identificando registros de irritação na pele e olhos, mutagenicidade, carcinogenicidade e efeitos sobre a reprodução entre outros.

Se projetarmos este percentual e esta dosagem média para toda área de cultivo de milho realizada no Vale do Taquari, teremos uma carga química despejada por ciclo produtivo neste agroecossistema de aproximadamente um milhão de litros de agrotóxicos. Parte desta carga certamente terá como destino final os sistemas aquáticos. Por serem poucos os trabalhos sistemáticos de monitoramento existentes com o foco nos recursos hídricos, é interessante avaliar o resultado do trabalho realizado pela Superintendência dos Recursos Hídricos e Meio Ambientes do Paraná entre os anos de 1976 e 1984, citado por LUNA, onde das 1825 amostras de água colhidas nos rios, constatou-se que 84% apresentavam resíduos de pesticidas.

Quanto à forma de aplicação, 24% das entrevistadas informaram que utilizam equipamentos de aplicação mecanizados e costal. A aplicação com equipamentos mecanizados ocorre nas áreas mais planas naquelas comunidades que dispõe de prestador de serviço. Já, 76% das propriedades utilizam exclusivamente equipamentos costais. É importante verificar que esta forma expõe muito mais o aplicador aos pesticidas, devido ao maior tempo necessário à aplicação e ao rigor físico exigido.

Com relação ao uso de equipamentos de proteção individual-EPIs, 94% das famílias entrevistadas informaram não possuir tal equipamento. Este dado reveste-se de relevância, pois existe uma correlação direta entre casos de contaminação e aplicação de agrotóxicos sem uso de equipamentos de proteção individual.

Um trabalho realizado em 2002 pelas Universidades de Caxias do Sul e Federal do Rio Grande do Sul, junto a produtores do Nordeste Gaúcho, comprovou que 22% estão intoxicados pelo uso continuado de agroquímicos e 53% apresentam estresse oxidativo. Para o grupo controle foram escolhidas pessoas com a mesma faixa etária que não tem contato direto com agrotóxicos, comprovando que nenhum apresentava contaminação. A mesma pesquisa constatou que apenas 38% dos agricultores consultados usam os equipamentos individuais de proteção de forma completa.

Com base nesta amostragem concluímos que nunca ao longo da sua história, a pequena propriedade familiar da Região, utilizou tanto agrotóxico como atualmente vem utilizando.

Paradoxalmente, contrastando com o acesso e disponibilidade de informações, inclusive exigida por força de lei ao adquirir um pesticida qualquer, os usuários destes produtos majoritariamente não possuem e, portanto não utilizam equipamentos de proteção a sua própria saúde.

O produtor, que pela sua lógica, acredita naquilo que vê apenas, constitui-se numa vítima deste sistema produtivo, ao negar os riscos à sua própria saúde, certamente seu maior patrimônio pessoal. Tal fato pode estar ligado à permissividade da propaganda dos agrotóxicos, que sonega informações sobre os riscos potenciais à saúde a que usuários e consumidores estão expostos.

Como ação direta, após este estudo de caso, a equipe local da Emater/RS/Ascar realizou um trabalho de esclarecimento junto às outras comunidades não envolvidas no primeiro momento. Também realizou um trabalho em conjunto com a Escola Estadual 25 de maio, dirigido às turmas do primeiro, segundo e terceiro ano do segundo grau, procurando sensibilizar este público para a grave realidade identificada. O mérito do trabalho realizado a partir da realidade vivenciada pelas famílias rurais, foi de recolocar na pauta da rotina da assistência técnica e extensão rural pública de Imigrante, este tema desafiador tido como superado, bem como de apontar para a necessidade de construção de outro caminho possível.

Potencialidades e limites
Frente a esta realidade impõe-se como ponto de partida imediata ao ensino, pesquisa e extensão rural, desenvolver estratégias para compor sistemas produtivos com desempenho ambiental e humano mais satisfatório e sustentável.

Este trabalho pode servir de alerta a outros municípios que podem estar vivenciando passivamente a mesma realidade. A metodologia simples utilizada pode ser facilmente reproduzida no ambiente de trabalho da extensão rural.

Noutro campo, os resultados visualizados que são preocupantes do ponto de vista da saúde pública, podem servir de indicador de eficiência dos instrumentos legais hoje utilizados na comercialização de agrotóxicos. Quero crer que esteja ocorrendo falhas graves na utilização destes instrumentos o que exige um olhar mais atento dos conselhos profissionais e órgãos públicos de fiscalização, incluindo uma avaliação da propaganda empreendida pelas empresas que produzem e comercializam tais produtos.

Autores e colaboradores
Autor da sistematização: Engenheiro Agrônomo Lauro Bernardi
Colaboradora: Extensionista Social Nair K. Massotti e Técnico agrícola Antônio Maccali

Rede de contato
Escritório Municipal da Emater/RS-Ascar emimigra@emater.tche.br; emsclara@emater.tche.br; e l.bernardi@terra.com.br ;

Bibliografia consultada
CLARO, S. A & PAGANELLA, F. Agrotóxicos que afetam a vida. Sobradinho. 2000.
LUNA, A. J; SALES, L.T; SILVA, R.F. Agrotóxicos: responsabilidade de todos.
Fundacentro. Pernambuco. 1999.19p.
GIRARDI, G. A última colheita: Uma epidemia de suicídios. Revista Galileu. 2002.
FERRO, F. A tragédia dos agrotóxicos. Anais Câmara Deputado. Brasília. 1996.
CORREIO RIOGRANDENSE. Agrotóxicos envelhecem e expõe produtor a doenças.
Caxias do Sul. Out.2002.p 4.
CHABOUSSOU, F. Plantas doentes pelo uso de agrotóxicos: a teoria da trofobiose.
2 ed. Porto Alegre: L&PM, 1999. 272P.
CAVERO, S. E. & GERRA, M. S. Inseticidas e Acaricidas: Toxicologia e Receituário.
Agronômico. Piracicaba. Livroceres. 1982. 424p.
CARSON, R. Primavera Silenciosa. Ed. Melhoramentos. São Paulo. 1964. 305p.
BRONFIELD, L. Vale Aprazível. Ed. Melhoramentos. São Paulo. 1962. 268p.
GLIESSMANN, S. A agricultura pode ser sustentável. Agroecologia e Desenvolvimento
Rural Sustentável. Rev.EMATER-RS. V.1,n.3, jul/ago/set. 2000.


AGROECOLOGIA - CIÊNCIA E MOVIMENTO SOCIAL
"Este vídeo é uma contribuição de professores e estudantes da UFBA apra a difusão nacional e internacional da Agroecologia. O professor Manoel Baltasar da UFSCAR apresenta as bases teóricas e pincípios agroecológicos enquanto agricultores, sindicalistas e representantes de ONGs faltam de suas práticas e experiências".

domingo, 13 de janeiro de 2008

3ª Feira Binacional de Economia Popular Solidária





Iara Borges Aragonez
Coletivo Desenvolvimento Sustentável Semapi e
Cooperativa GiraSol – Comércio Justo e Consumo e Consciente

Aconteceu em Santa Vitória do Palmar, na praia do Hermenegildo, nos dias 10,11, 12 e 13 de Janeiro de 2008, a 3ª Feira Binacional de Economia Popular Solidária.

A Feira Binacional foi promovida pela Senaes, Marcha Mundial das Mulheres, Fórum Estadual de Economia Solidária e Associação do Trabalho e Economia Solidária (Ates), com apoio de grupos produtivos do segmento.

Foram três dias de intensa atividade.

Além da comercialização de produtos da economia popular solidária, debates, oficinas e momentos lúdicos, foi realizada a plenária do Fórum Gaúcho de Economia Popular Solidária, preparatória à plenária do Fórum Brasileiro www.fbes.org.br/ que acontecerá em março de 2008 e definirá a estratégia de desenvolvimento e organização do movimento de economia solidária no Brasil.

Dentre as oficinas realizadas, a de Consumo Consciente, coordenada pela Cooperativa GiraSol, provocou nos participantes a reflexão sobre o ato cotidiano de consumir, partindo da posição ocupada na sociedade por cada um (a). Nesse sentido, o debate ocorreu considerando o consumo que praticamos enquanto indivíduos, no âmbito familiar e social; enquanto produtores, consumidores de insumos para a produção de produtos, e, enquanto integrantes de organizações, sejam elas governamentais ou não governamentais. Neste último caso, foi compreendido que, participantes de ONGs, sindicatos, universidades, órgãos públicos, etc. que consomem tanto para a execução de suas tarefas como na oportunidade em que realizam seus eventos e festividades, podem e devem interferir nas decisões internas quanto a compra de produtos.

O foco central do debate foi a conseqüência nefasta de determinados processos produtivos para o ambiente natural, para a dignidade dos (as) trabalhadores (as) e para a sociedade em geral. Falou-se sobre a possibilidade concreta de, pelo consumo, contribuirmos para a preservação ambiental e para uma maior distribuição de renda. Foi compreendido que isto é possível se decidirmos investir os nossos salários/remunerações na compra de produtos de empreendimentos econômicos do campo popular solidário, reduzindo cada vez mais a compra dos grandes empreendimentos que exploram o trabalho, degradam o ambiente e concentram a renda. E que esta escolha é diária, seja enquanto indivíduos, produtores ou participantes de organizações.

A oficina concluiu que podemos incidir nessa realidade. E você, pensa que podemos?

Esta é mais uma iniciativa no Estado do RS que contribui para o avanço na construção de uma outra economia, cuja perspectiva é o desenvolvimento sustentável. Trabalhadoras e trabalhadores organizados (as) de forma coletiva e autogestionária, sem exploração do homem pelo homem, com respeito ao ambiente natural, são algumas das características dessa forma de organização produtiva que vem sendo construída com muita garra e diariamente nessas últimas (quase) duas décadas por trabalhadores(as) expulsos(as) do mercado formal do trabalho, ou historicamente excluídos.

Você concorda que esta outra economia é possível?
Faça o seu comentário sobre o tema no Blog e contribua com essa costrução.


A partir das políticas públicas implementadas no âmbito do Governo Federal, no site www.mte.gov.br/ecosolidaria/prog_default.asp você pode saber mais sobre como anda a economia solidária no Brasil.

Saudações solidárias.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Uma viagem no Tempo

Parece-me indiscutível que a nossa prática já consagrada de “fatiar o tempo” seja altamente positiva, pois, segundo o poeta Drummond, nos faz crer no “milagre da renovação” possibilitando que, a cada 12 meses, “tudo comece outra vez”, e é claro, livres que somos para sonhar, crer ainda que desta vez será bem do jeito que a gente quer e gosta.

E essa idéia é sempre muito alentadora. Quantos planos e sonhos nos alimentam a cada ano que sai e a cada ano que entra!

Porém, é importante nos darmos conta que a vida é também um ato contínuo no tempo, em que pese suas idas e vindas, seus laços e entrelaços, mais ou menos amarrados. Deixa marcas e muitas vezes traça perspectivas sem ao menos notarmos. E nada como uma espiada no passado para percebermos isso.

Apoiada no historiador e folclorista gaúcho Barbosa Lessa, comparto com vocês uma narrativa sobre o “começo de tudo”, que nos permite perceber que há muita relação entre tempos que findam, tempos que acontecem e tempos que ainda virão. Isso, se fizermos as devidas relações com o dito, com o acontecido, com o que poderia acontecer se... e com o agora anunciado porvir.

Vida, Tempo, Mitos, Lendas, Fatos e Feitos, imbricados entre si, interferindo e sofrendo interferências.

Baseado na mitologia do Rio Grande do Sul, o autor remonta ao século XVII, ao Deus Guarani, Nhanderuvuçu, nos permitindo sentir a forte simbologia dos mitos cuidadosamente criados pelos povos indígenas, com o poder de equilibrar a vida, nos anunciando desde então que a natureza nasceu para ter vida eterna e para atender as necessidades dos homens apenas e somente na medida do “só para poder viver”. Manter a necessária harmonia entre todos os elementos da natureza já estava colocado desde sempre. Mas os homens e mulheres desse mundo não quiseram ver e não quiseram ouvir.

Por isso fico com as duas formas de olhar e sentir o Tempo e a Vida. Fatiado, para não perder a sensação do doce “milagre da renovação”, mas também no seu contínuo e imbricado desenrolar, buscando constantemente a interligação entre passado, presente e futuro, seja pelos mitos e lendas ou pelos fatos e feitos de homens e mulheres de carne e osso ao longo de nossa triste, alegre, feia e bela história.

E não esqueçamos que o ano que se vai a cada ano, já faz parte de nossa história, e que também nesse pequeno interregno já construímos nossas lendas, nossos mitos e já realizamos muitos feitos. Cabe a nós saber ver e saber fazer as melhores conexões e também saber que alguns mitos precisam ser desmistificados para nos aproximarmos da harmonia e do equilíbrio tão necessários para o nosso bem viver. Coletivo e pessoal.

Abaixo, dois recortes do capítulo “Gênesis” do livro “Rodeio dos Ventos” de Barbosa Lessa. Esse capítulo é composto por 10 pontos assim chamados: (i) A criação do céu e da terra; (ii) O primeiro fazedor de coisas; (iii) O primeiro pajé; (iv) O primeiro casal; (v) Como surgiu a noite; (vi) Os dois caminhos do Tempo; (vii) A origem do fogo; (viii) O dilúvio; (ix) A tradição e (x) Eclesiastes.

Além desse capítulo, outros nos provocam a pensar sobre a relação entre a ação do homem e a "vingança da natureza", como o que fala do Îvîtu-Yepivu, "um vento em redemoinho", que, segundo a tradição indígina, só passou a existir no Rio Grande do Sul quando os "...primeiros europeus, no século XVII, vieram explorar os recursos naturais do rio Uruguai num nível além da simples economia de subsistência preconizada pela religião guarani...".

Boa leitura!
Iara Borges Aragonez.


A criação do Céu e da Terra

"no princípio, criou Nhanderuvuçu a atração das coisas, o Anhang dos anhangs, que era a força de Si Mesmo", diz. Mas viu Nhanderuvuçu que assim, só de atração, eram as coisas sem forma, cor, sem movimento e vazias. Então criou Nhanderuvuçu o oposto de Si Mesmo, Nhanderu-Mbaecuaá, a repulsão das coisas. E, por isso, nasceu a Terra, que é a mãe Nhandecy. E geraram Nhanderuvuçu e Nhanderu-Mbaecuaá no ventre de Nhandecy, as quatro-forças-em-uma, que dão equilíbrio à vida: Yara, a mãe das águas; Tupá, o guardião dos ventos; Curupira, o defensor das matas por si só nascidas e dos animais que vivem nas matas, nos campos, nas águas, nos ares; e Ceucy, a mãe das plantas plantadas e protetora da casa que nasce junto aos roçados. E, para que as coisas vivessem, criou Nhanderevuçu o Kayuá, o dom da palavra, pois uma coisa só existe quando há um nome para chamá-la. E então pode Nhanderuvuçu dizer: "Haja ervas, árvores, cipós; haja pássaros no ar, peixes na água, bichos na face da terra". E cada anhang (a atração das coisas) e cada forma, unidos, resultaram no nome dessas coisas. E havia só um Tempo e uma só Luz, ambos eternos. E, para o governo dos homens, geraram Nhanderuvuçu e Nhanderu-Mbaecuaá no ventre de Nhandecy, gêmeos civilizadores. E eles foram Nhanderiquei, o gêmeo primeiro, força do Sol, filho do Pai; e Tiviry, o gêmeo segundo, força da Lua, filho de Nhanderu-Mbasecuaá. E nem havia ainda lua, nem casa, nem plantas plantadas, nem mesmo o homem e a mulher; mas Nhanderuvuçu, que tudo sabe e prediz, soube e previu".


O primeiro fazedor de coisas


Sedento e faminto estava Tiviry, o gêmeo segundo. Então pediu Nhanderiquei a proteção de Yara, que lhe trouxe a água da fonte; e a proteção de Curupira, que lhe trouxe raízes, ovos de pássaros, a pitanga e a guabiroba, o doce mel da mirim. Faminto tornou a ficar Tiviry, porque esses bens eram poucos. Então pediu Nhanderiquei que Curupira lhe deixasse matar o peixe do rio, o pássaro do céu e os animais da floresta. Disse Curupira que, sob a luz, tudo nasceu para viver eterno; mas permitiu que matasse, desde que o só para poder viver. E inventou Nhanderiquei o arco, a flexha, o mundéu e a arapuca. Faminto tornou a ficar Tiviry, porque esses bens eram poucos. Então pediu Nhanderiquei que Curupira lhe deixasse derrubar um pouco de mata, para plantar sementes de Ceucy. Disse Curupira que a mata também é eterna; mas permitiu que derrubasse, desde que só para poder viver. E inventou Nhanderiquei o machado de pedra, para derrubar a mata; o sarquá, para furar o chão no receber da semente; e o balaio, trançado de taquara para encher, depois, com os frutos da colheita. E trouxe Ceucy a fartura das plantas plantadas e ergueu a casa que a mulher ia cuidar. E viu Tiviry que tudo isto era bom.

Barbosa Lessa

Historiador e Folclorista do
Rio Grande do Sul.