sábado, 21 de março de 2009

O Consumo como “arma” para enfrentar o Capitalismo - Eixo: Hábitos de Consumo como fator de Soberania Alimentar


Iara Borges Aragonez
Coletivo Desenvolvimento Sustentável
SEMAPI

(...) O SEMAPI, em 2006, no Segundo Congresso, tirou como uma de suas resoluções a criação do Coletivo Desenvolvimento Sustentável, sendo este instituído pela gestão 2007-2010. Um dos eixos estruturantes do seu planejamento estratégico é o Consumo e Sustentabilidade, o qual organiza as ações relacionadas à re-significação do ato cotidiano de consumir. Esse eixo justifica-se pela nossa convicção de que o modelo de consumo da sociedade capitalista, um dos pilares da mesma, é um dos principais responsáveis pelos danos sociais, culturais e ambientais que o planeta terra hoje vivencia. Além disso, o consumo tem um caráter universal, está presente no cotidiano de todas as pessoas e pode cumprir um papel pedagógico para a compreensão da lógica capitalista e criar as condições objetivas para o seu enfrentamento pela base.

Na abordagem do eixo estruturante, Consumo e Sustentabilidade, temos privilegiado a reflexão sobre a relação entre Soberania Alimentar e Consumo, pois compreendemos que nela o caráter pedagógico e transformador potencializa-se. Primeiro, porque pode ser tratado a partir de várias dimensões, desde aquelas mais próximas e visíveis no cotidiano como saúde, paladar, cultura alimentar, relações sociais, familiares, até aquelas de caráter mais macro, como dominação econômica, dependência externa, soberania dos povos, dominação cultural, degradação ambiental, exclusão social; segundo, porque o tema perpassa, de forma distinta, os diferentes grupos sociais aos quais nos relacionamos enquanto sindicato. Diz respeito tanto ao corpo diretivo, quanto aos trabalhadores do Sindicato, quanto a base sindical e quanto aos movimentos sociais, sendo que cada um deles nos possibilita diferentes abordagens e repercussão distinta em diferentes realidades.

Por essas razões, dentre outras, entendemos que a incorporação do Consumo como bandeira de luta do movimento sindical e social é mais uma tática importante para o enfrentamento do capital e para disseminar o debate na sociedade de forma mais ampla e mais contundente. A partir desse diálogo social ampliado, abordando o significado do consumo, espera-se ampliar a demanda por alimentos produzidos localmente e de forma ecológica, o que equivale a dizer que o movimento sindical e social, via o combate ao consumo induzido pelo capital, é capaz de incidir na distribuição de renda e no fortalecimento de uma produção sustentável, levada a termo pela agricultura familiar de base ecológica e pela economia solidária. Se criado um grande e massivo movimento, acreditamos ser possível fragilizar economicamente, em cada localidade onde atuamos, empresas sustentadas pelo grande capital.

Trabalhar a Soberania Alimentar favorece a reflexão política a partir de situações locais e do cotidiano. O conceito de Soberania Alimentar incorpora a idéia de autonomia. Não apenas a autonomia individual, mas dos povos. Por isso é revolucionário. Um povo, uma nação, capaz de produzir o seu próprio alimento, de forma independente, com qualidade, quantidade e permanência, atendendo o conjunto de suas necessidades, está a um passo de ser Soberano. Essa concepção organiza uma pauta de lutas diferente daquela formulada a partir apenas da idéia de Segurança Alimentar, a qual focaliza o conceito no acesso aos alimentos, discutindo questões sociais, nutricionais e de saúde, sem ênfase na sua origem. Essas questões são, sem sombra de dúvidas, muito relevantes, porém, alargar o olhar, alarga o horizonte de luta(...)

Apresentamos abaixo a síntese das discussões dos grupos de trabalho da oficina Consumo como fator de Soberania Alimentar realizada em Santana do Livramento, parte das atividades do 8 de Março. De acordo com a lista de presenças, tivemos representações das seguintes organizações: SINDJUS, Assistência Social do Uruguai, CPERS, Marcha Mundial das Mulheres, CONSEA de Santana do Livramento, SEMAPI, PT/RS, PT Santana do Livramento, Via Campesina, Fepagro, AFUFE, CTA, Casa de Convivência Santa Clara, Federação dos Bancários/RS, Economia Solidária, SMATS e Sindicato dos Bancários.

A idéia de socializar pelo Blog é possibilitar que seus leitores tenham a oportunidade de fazer suas considerações sobre o tema, comentando os pontos levantados pelos participantes da Oficina. E também para que os próprios oficineiros avancem na reflexão e proposições.


PROVOCAÇÃO:
Quais proposições abaixo são comuns aos diferentes grupos e nos remetem a uma boa construção coletiva em um futuro próximo? Para iniciarmos uma grande mobilização pelo CONSUMO CONSCIENTE, começamos por onde?

Registre a sua opinião no espaço destinado a comentários e vamos nos organizar.



GRUPO 1

Destaca a necessidade de algumas medidas estruturais, tais como:
Ampliação da política de reforma Agrária, Estímulo à Agricultura familiar
Estímulo ao Cooperativismo, Ampliação do poder aquisitivo da população.

Em relação a ações mais locais, destaque para:
Grupos locais para debater e realizar ações de conscientização.
Feiras de produtos da Agricultura familiar/Produtos Agroecológicos.
Organização de Redes de Consumo Consciente.
Internet, rádios, jornais, Programa de Reeducação Alimentar nas escolas.
Aquisição de alimentos da Agricultura Familiar local pelo poder público.

GRUPO 2

Pontos destacados:
A necessidade de mudar o modelo de produção, colocando a lógica da vida acima do lucro. Uso da ciência para a humanidade.
A necessidade de substituir a ditadura da “razão” pela ideologia da vida, moldando as subjetividades coletivas.
A necessidade da adoção de novo modelo habitacional, com hortas, utilizando alternativas energéticas. Propriedades e moradias sustentáveis, ecológicas e em rede.
A necessidade de multiplicar atividades de divulgação do consumo consciente e do comércio justo.
Construir a mídia alternativa.
Não envenenar o habitat.
Usar a mídia//marketing a nosso favor para difundir nossas idéias.

GRUPO 3


Pontos destacados:
Mudar é possível.
A família urbana deve buscar a prática da Permacultura.
A mudança é silenciosa. O conhecimento é necessário.
Desligar a TV, desfrutar o comer juntos e com calma, sem interferências.
Envolver a criança no preparo do alimento.
Criar redes entre o campo e a cidade através de associações e cooperativas.
Fomentar localmente a criação de cooperativas de consumo consciente.
Difundir essas idéias aproveitando-se dos meios eletrônicos / mídia existente nas cidades. E, no campo, utilizar a mala direta.
Boicotar os alimentos industrializados não os adquirindo das redes que não estejam comprometidas com o meio-ambiente ecologicamente saudável.
Políticas públicas para a produção de alimentos agroecológicos.
Criar leis municipais para a inserção de alimentação saudável nas escolas.
Formar grupos de estudos que ensinem a alimentação saudável.

Boicote às multinacionais. Boicote à biopirataria. Boicote ao silêncio. Boicote ao veneno. Boicote ao transgênico. Boicote à mídia. Boicote à exploração.

GRUPO 4

Pontos destacados:
Na escola trabalhar o consumo consciente
Buscar junto aos governantes a criação de incentivos e fiscalização
Boicote aos alimentos industrializados
Fiscalização as propagandas, buscando embasamento na Lei. No caso de propagandas que alimentos/bebidas que fazem mal a saúde, como a coca-cola.
Conscientização promovida por associações de bairros, Sindicatos, escolas, igrejas.
Debate diário: Debater sempre com todos. Vizinhança, rodas de bate-papo no dia-a-dia, na escola.

GRUPO 5


Pontos destacados:
Falta de tempo
Porque nós mulheres temos jornada dupla e, ainda em maioria, quem faz o preparo do alimento na casa .
Cultura
Temos a cultura da rapidez
Comodismo
de só aquecer, só congelar. Somos muito cômodos.
Consumismo
Com o advento do consumismo, do fast food, o resultado é o aumento de pessoas com obesidade, diabetes, colesterol por causa dos efeitos das gorduras “trans” contida nesse tipo de alimento.
Mídia
A mídia é quem traz isso se utilizando de propaganda massiva e intensiva.

Alternativas:
Falta de tempo
Combater a preguiça; estabelecer jornada de trabalho consciente e priorizar a vida saudável.
Cultura
Ter o seu lazer, cultivar uma horta (e animais) nos pequenos espaços. Ainda que haja denúncias dos vizinhos por essa iniciativa, mas poder trabalhar junto da atual legislação abrindo direitos para isso.
Educação.
Educação que se inicia dentro da casa de cada um. Inserir bons hábitos alimentares e ecológicos.
Consumismo
Ampliação da oferta de alimentos saudáveis, horários alternativos das Feiras de Produtores. Dessa forma o trabalhador poderá ter opção de consumo consciente no horário que também lhe convir.
Mídia
Desobedecer à mídia, não comprando alimentos industrializados

terça-feira, 10 de março de 2009

8 de Março - Um Novo Mercosul é Possível




Dentro das atividades do Dia Internacional da Mulher – 8 de Março – realizadas em Santana do Livramento – Um Novo Mercosul é Possível – O SEMAPI Sindicato realizou um conjunto de ações. Dentre elas, a oficina Hábito de Consumo como fator de Soberania Alimentar, coordenada pelo Coletivo Desenvolvimento Sustentável, em uma ação articulada com a Marcha Mundial de Mulheres do RS.

Abriu a Oficina, Joana Stédile, representante da Marcha. Esta destacou a importância desse debate e lembrou o papel que as mulheres, em particular as mulheres do campo, têm cumprido para a biodiversidade, preservando sementes e praticando uma agricultura limpa. Referiu-se a falácia da revolução verde que veio para resolver o problema da fome e ainda hoje milhões de pessoas vivem em extrema pobreza, sem acesso a uma alimentação saudável. Destacou que a revolução verde fortaleceu a monocultura, a expulsão de homens e mulheres do campo e desenvolveu-se à custa da degradação ambiental pelo uso intensivo e indiscriminado de agrotóxicos. Falou também do status de mercadoria assumido pelos alimentos no modelo de desenvolvimento atual, quando, em verdade, deveriam ser tratados como um direito da população.

Na seqüência, a Oficina, a partir da explanação da coordenadora do Coletivo Desenvolvimento Sustentável do SEMAPI, Iara Aragonez, foi destinada à compreensão do conceito de Soberania Alimentar no contraponto com o conceito de Segurança Alimentar. Logo após, foram trazidos elementos que evidenciaram o quanto hábitos alimentares e práticas cotidianas de consumo podem influenciar para a soberania alimentar de um povo. A partir dessa abordagem foi destacado que há uma possibilidade enorme de ações que contribuam para a construção de uma sociedade mais justa, as quais independem da macro-política e da macro-economia, pois são possíveis de serem implementadas a partir das relações estabelecidas diariamente para a reprodução da nossa existência. Ficou destacado que criar outro modelo de consumo é possível quando temos a consciência da perversidade do modelo hegemônico e nos mobilizamos coletivamente para essa transformação.

O segundo momento propiciou a contribuição direta dos participantes da Oficina, os quais, apoiados em textos de autores, como Frei Beto, Iara Aragonez, João Pedro Stédile e Leonardo Boff, posicionaram-se sobre o tema. Do conjunto das reflexões apresentadas na plenária que encerrou a Oficina destaca-se que foram apontadas ações e estratégias necessárias e possíveis de serem implementadas pela militância.

Capilarizar esse debate, envolvendo escolas, associações, sindicatos e outras instituições formadoras de opinião, criando grupos locais de discussão na perspectiva da ampliação de consciências sobre o significado do consumo e sobre hábitos alimentares e provocar a organização de redes de consumo consciente, foram algumas das ações consideradas importantes para aqueles que lutam por uma sociedade mais justa e por uma nação livre e soberana.

Além disto, foi destacado como fundamental não perder de vista a luta pela ampliação da Política de Reforma Agrária, pelo fomento da Agricultura Familiar, do Cooperativismo/Economia Solidária e pela ampliação da renda da população.

O acordo final da Oficina foi de que a mesma deveria ser entendida como o início de um longo processo. A Marcha Mundial das Mulheres e o Sindicato SEMAPI, dando continuidade a parceria inaugurada no “Encontro Nacional Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética”, realizado em Belo Horizonte, em agosto de 2008, cumprirão o papel de acolher demandas e também de serem propositivos em relação a oficinas descentralizadas.

O propósito é continuar contribuindo na provocação do debate e mobilizando para ações transformadoras capazes de impulsionar o consumo consciente, contribuindo assim para o fortalecimento de uma produção sustentável, levada a termo pela agricultura familiar de base ecológica e pela economia solidária de nosso Estado.

A Oficina em Santana do Livramento contou com aproximadamente 60 pessoas e foi exitosa do ponto de vista dos objetivos a que se propôs. Assim que a sistematização dos trabalhos em grupo estiver concluída a estaremos publicando nesse blog, juntamente com as imagens produzidas durante as atividades.

...o conteúdo do conversar numa comunidade não é inócuo para essa comunidade, porque arrasta consigo seus afazeres... (Humberto Maturana)