quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Declaração Final do Encontro Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética



Uma breve síntese da participação do SEMAPI Sindicato e logo após a Declaração Final do Encontro Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética.
Foram quinhentas mulheres, negras, brancas, indígenas, quilombolas, sem terra, agricultoras, sindicalistas, mães, solteiras, casadas, jovens, estudantes, idosas, lutadoras que, de todas as regiões do Brasil, de 23 estados, de mais de 20 organizações, urbanas e rurais, reuniram-se em Belo Horizonte (MG), no período de 28/08 à 31/08, para apropriarem-se e debater sobre o grande tema da atualidade, Soberania Alimentar e Energética.

Os temas tratados foram muitos: Soberania Alimentar e Energética: Energia para que e para quem?, Integração, Soberania Alimentar, Energética e Economia Feminista, Convivência com o Semi-Árido, Agroecologia, sementes crioulas e agricultura urbana,
Resistências e ações diretas das mulheres contra as transnacionais, Ocupações dos espaços e territórios urbanos, Preço da energia, Produção energética descentralizada, Consumo e Economia Solidária, Trabalho doméstico e creches, dentre outros.

Detaca-se que o SEMAPI Sindicato esteve representado, sendo relatada a sua experiência em curso, na perspectiva da sustentabilidade, baseada na reflexão para a adoção em seu cotidiano de novas práticas de consumo. Na mesa CONSUMO e ECONOMIA SOLIDÁRIA, valendo-se da experiência recolhida também da vivência na Cooperativa GiraSol - Comércio Justo e Consumo Consciente, Iara Aragonez falou do consumo como uma potente "arma" para enfrentar as transnacionais que controlam a cadeia produtiva alimentar e que no seu processo produtivo geram danos ao meio ambiente e a sociedade. Considerou que os movimentos sociais e organizações como sindicatos, associações, conselhos, ONGs, que têm como pauta e bandeiras, o enfrentamento do capital, devem incluir em suas táticas, o boicote a produtos e a empresas que simbolizam a dominação. Destacou que tal medida coletiva é um árduo caminho, pois, a sociedade orienta a sua prática de consumo induzida pela publicidade e pelos meios de comunicação hegemônicos e, de forma alienada, respondem aos seus incessantes apelos, perdendo o olhar crítico.

Entretanto, diz, há que se incluir o CONSUMO CONSCIENTE em nossa pautas, criando densidade social e as condições objetivas para atingir, por essa via, a alma do capitalismo.

Orientar os nossos salários e os orçamentos das organizações nas quais militamos, que em sua grande parte são compostos por recursos dos trabalhadores(as), para fortalecer economicamente empreendimentos do campo popular solidário, no qual localizam-se a ECONOMIA SOLIDÁRIA e a AGRICULTURA FAMILIAR ECOLÓGICA, é o caminho. Atualmente, grande parte das organizações realizam seus eventos e tocam o seu cotidiano, consumindo bebidas e alimentos industrializados, das grandes redes, e, por conseqüência, fortalecendo economicamente o inimigo ao qual combatem em seus discursos e em suas marchas.

"Desobedecer"* a mídia, a publicidade, a força da sedução dos produtos industrializados, dentre outras imposições do capital, é uma forma ativa de resistência. E, a nós, protagonistas dos movimentos e organizações, cabe mobilizar a sociedade,também para essa forma de resistência.

Foi muito interessante o debate e constatado que esse tema do consumo está ainda em construção/formulação nos movimentos e organizações da esquerda brasileira, sendo sim necessária uma maior apropriação do tema e de sua força, bem como a incorporação do mesmo como balisador das decisões do cotidiano, incluindo-o no conjunto de táticas que já lançam mão em suas lutas para o enfrentamento do capital.

*Thureau, em 1849, desenvolveu a tese da "desobediência civil", como forma de enfrentar o poder instituído e as leis injustas. Serviu como uma tática principal aos movimentos nacionalistas em antigas colonias da África e Ásia, antes de adquirirem a liberdade. Mahatma Gandhi, usou a desobediência civil como uma ferramenta anti colonialista.

"Se um homem marcha com um passo diferente do dos seus companheiros, é porque ouve outro tambor".(Thureau)

Iara Borges Aragonez.
SEMAPI Sindicato

Abaixo, a

Declaração Final do 1° Encontro Nacional de Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética.


Por soberania Alimentar e Energética!

Nós, mulheres do campo e da cidade reunidas em Belo Horizonte, de 28 a 31 de Agosto de 2008, expressamos nossa visão sobre desafios e alternativas para a construção de Soberania Alimentar e Energética.

Somos mulheres organizadas, protagonistas de lutas de resistência em defesa de uma sociedade igualitária, onde a organização da economia tenha como centralidade a sustentabilidade da vida humana e não o mercado e o lucro.

O modelo atual de desenvolvimento se apropria do racismo e do sexismo. Fundamenta-se em uma visão de economia que considera o econômico apenas as atividades mercantis e desconsidera a reprodução e invisibiliza o trabalho das mulheres. Esse modelo se pauta por uma concepção de desenvolvimento baseada na idéia de crescimento econômico ilimitado, onde o mercado e o lucro privado são priorizados em detrimento do interesse público e dos direitos humanos fundamentais, onde a política econômica se orienta pela opção exportadora, apoiada fortemente pelo Estado, no agronegócio empresarial e no setor minero-metalúrgico-energético e em uma demanda energética insustentável.

Para manter esse modelo, grandes projetos energéticos e de infra-estrutura são construídos, distantes das lógicas produtivas e culturais que organizam os territórios, provocando a expulsão do campesinato e de populações tradicionais das suas terras, a contaminação dos trabalhadores e trabalhadoras e o aprofundamento da crise ambiental e das mudanças climáticas. Ao mesmo tempo, são desconsiderados os caminhos alternativos e modos de desenvolvimento voltados para a igualdade social e a justiça ambiental que nossos movimentos têm proposto a partir de suas práticas concretas nos territórios que se pautam pela construção de Soberania Alimentar e Energética.

Em contraposição a este modelo afirmamos nossa luta feminista e socialista por uma nova economia e sociedade baseada na justiça social e ambiental, na igualdade, na solidariedade entre os povos, assentada em valores éticos coerentes com a sustentabilidade de todas as formas de vida e a soberania de todos os povos e comunidades tradicionais sobre seus territórios.

Diante disso:

Denunciamos:

O atual modelo de produção de energia que visa manter um padrão de produção e de consumo ambientalmente insustentável e socialmente injusto, baseado no monopólio das fontes de energia pelas grandes empresas.

As falsas soluções de mercado que estão sendo propostas para reverter o quadro de mudanças climáticas como a produção de agrocombustíveis em grande escala, assim como as expansão de impactantes projetos hidroelétricos e a retomada do programa nuclear brasileiro, energia perigosa, cara e sem soluções para os seus rejeitos.

O atual modelo de produção de agrocombustíveis, baseado em monoculturas; modelo defendido pelo governo brasileiro e controlado pelo agronegócio, que vem homogeneizando os territórios, pressionando a expansão das fronteiras agrícolas, gerando impactos sociais e ambientais e que tem sido um dos grandes responsáveis pelo aumento dos preços dos alimentos.

A especulação internacional dos produtos alimentícios que também se constitui em uma das causas do aumento dos preços dos alimentos, ao lado do aumento do preço do petróleo e do desvio de alimentos para produção de etanol e biodiesel.

O trabalho escravo que sustenta esse modelo e as péssimas condições de trabalho e de exploração do assalariado e assalariada rural, além do abuso sexual e o assedio moral a que são vitimas trabalhadoras do campo e da cidade.

Que o controle da cadeia produtiva alimentar pelas grandes transnacionais ameaça a soberania alimentar e a saúde da população. Em especial os produtos transgênicos e os altos níveis de agrotóxicos utilizados nos alimentos com a cumplicidade das autoridades públicas que não zelam para que as legislações sobre rotulagem de transgênicos e agrotóxicos sejam respeitada pelas indústrias.

O desaparecimento de sementes crioulas, a perda de biodiversidade e a ameaça a segurança alimentar em virtude da liberação comercial de cultivos transgênicos e da expansão das monoculturas de exportação, apoiadas por empresas e universidades publicas, enquanto falta pesquisa para avaliar riscos no meio ambiente e`a saúde do consumo de transgênico.

A privatização dos recursos naturais e a apropriação de nossas terras, a exploração da nossa floresta, das águas e de nossos rios, mares e manguezais pelo capital com apoio dos recursos públicos.

A privatização do setor elétrico que contribuiu para que as tarifas de energia sejam diferenciadas entre os consumidores residenciais e indústria e as políticas energéticas beneficiem as grandes indústrias para obterem cada vez mais, mais lucros.

As cidades brasileiras sofrem impactos diretos desse modelo de desenvolvimento alimentar e energético, com as altas taxas no preço da energia, com o aumento dos preços dos alimentos, com a precarização do trabalho e do transporte coletivo urbano e com a especulação imobiliária.

Reafirmamos:

A necessidade de construir um novo modelo energético para o Brasil que priorize a produção e a distribuição descentralizada de energia visando atender as necessidades locais e territoriais e que contemple a participação da população no seu planejamento, decisão e execução. E que contribua para a autonomia das mulheres, possibilitando a elas protagonizarem experiências de Soberania Energética em seus territórios.

A necessidade de desenvolvermos formas de consumo e comercialização de produtos de forma solidária e sustentável com o fortalecimento dos mercados locais e feiras livres, assim como o reconhecimento do trabalho produtivo das mulheres e seu fortalecimento.

Que é tarefa do Estado a viabilização de políticas públicas que garantam a nossa Soberania Alimentar e Energética.

A importância da pesquisa, desenvolvimento e implantação de fontes energéticas alternativas e o reconhecimento e investimento do Governo nas experiências descentrizadas de produção alternativa de energia, na socialização do trabalho doméstico e no fortalecimento da agricultura camponesa.

A agroecologia como projeto político para alcançar a soberania alimentar, assim como a luta pela Reforma Urbana, a agricultura urbana e a defesa de uma nova ocupação do espaço urbano para moradia e produção como orientadoras de políticas publicas.

A luta pelo direito à terra através da Reforma Agrária, onde esteja garantido o direito da mulher a terra, o acesso aos recursos naturais e `as decisões sobre seus usos.

Os direitos territoriais de povos indígenas e populações quilombolas.

O direito ao trabalho em condições dignas e bem remunerado. O direito a previdência social, a diminuição da jornada de trabalho, a socialização do trabalho reprodutivo.

Uma integração regional que esteja pautada na solidariedade, na complementariedade entre nossas economias, na sustentabilidade das praticas socioculturais e produtivas.

Nos comprometemos:

A lutar por justiça ambiental, pela reforma agrária, e em defesa da sustentabilidade da vida como valor central para a economia.

A desenvolver formas organizativas de luta das mulheres contra esse modelo de desenvolvimento que afeta o campo e a cidade e a denunciar permanentemente as diferentes formas de opressão e mercantilização que vivem as mulheres.

A construir e a fortalecer alianças entre movimentos sociais do campo e da cidade e a defender a necessidade de articularmos nossas experiências reivindicando políticas públicas que visibilizem as nossas experiências alternativas e nossas propostas para construção de uma transição rumo a um modelo de desenvolvimento que tenha como centro a sustentabilidade e a dignidade da vida humana.

A desenvolver formas de uso sustentável dos recursos naturais e das energias renováveis sustentáveis (eólica, solar e biomassa) bem como o aproveitando a água da chuva através da utilização de cisternas, o uso de placas solares e de experiências autônomas que contribuam para a construção de um novo modelo energético;

A lutar pela reestatização do setor elétrico e a defender o uso sustentável das águas e dos recursos energéticos.

A lutar pela autonomia econômica das mulheres e pelo direito ao trabalho digno e a fortalecer a luta dos trabalhadoras e trabalhadores assalariadas.

A lutar pela recuperação, preservação e multiplicação das plantas medicinais e sementes crioulas, em defesa da biodiversidade, da água e pelo direito de decidir sobre nossa vida, nossos alimentos, nosso corpo.

A lutar pelo direitos territoriais dos quilombolas e indígenas, porque suas lutas também são nossas. Por isso apoiamos a demarcação continua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol em Roraima e reafirmamos os direitos dos povos indígenas aos seus territórios.

A realizar as mobilizações dos dias 16 e 17 de outubro por Soberania Alimentar, a participar da campanha contra o preço de energia e a fortalecer nossa marcha no 8 de março como processos de reafirmação de nossa luta por soberania alimentar e energética, diante da necessidade de construir um novo modelo energético e alimentar para o Brasil.


Mulheres em Luta por Soberania Alimentar e Energética!

2 comentários:

Viva a Vida Sustentável disse...

ççç

Viva a Vida Sustentável disse...

Iara,
Valeu o linck sindical que amarra salário, consumo e produção conscientes.