sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Soberania Alimentar - Semapi debate possibilidades de uma sociedade sustentável



Uma sociedade sustentável o que temos a ver com isto?

Foi com esta interrogação que o Semapi (Coletivo de Desenvolvimento Sustentável e Núcleo Ecológico Sustentabilidade - Necoss), o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), a Marcha Mundial das Mulheres e a Cooperativa GiraSol realizaram o Seminário que tratou da Soberania Alimentar e Energética na véspera do Dia Mundial da Alimentação, na quarta-feira (15/10), a partir das 19 horas, no auditório da Entidade.

O Seminário foi uma maratona de informações e relatos de experiências, ao mesmo tempo em que animaram as perspectivas de se repensar o mundo e uma nova forma de se viver no planeta.

Confira as fotos do seminário sobre Soberania Alimentar e Energética

Manifesto de abertura

A saudação inicial foi feita pela diretora do Semapi Iara Aragonez que leu um pequeno manifesto, onde as entidades organizadoras expressaram o seu propósito com a atividade e algumas convicções em relação ao tema

"O nosso objetivo hoje é avançar na reflexão sobre a crise alimentar e energética a partir da agenda positiva dos movimentos sociais do nosso Estado que fazem de forma aguerrida a resistência e o contraponto ao agronegócio, à transgenia, à monocultura, ao modelo de produção hegemônico que acaba com a nossa diversidade biológica, social e cultural, assim como, ao padrão de consumo imposto pela mídia e pelas grandes redes que invadem o nosso território e induzem à compra desenfreada de seus produtos em detrimento da nossa saúde, da nossa cultura e do desenvolvimento local, seja este no campo ou na cidade. Portanto, queremos hoje, aqui, afirmar e reafirmar coletivamente que a superação dessa crise passa necessariamente pela construção da nossa Soberania Alimentar e Energética, pois, temos a convicção de que esse é o único caminho capaz de restituir a dignidade de nossa gente e garantir a autonomia dos povos".

Três crises colocam em risco o planeta

O assessor da Via Campesina, Frei Sérgio Görgen chamou a atenção para três tipos de crises que estão afetando o mundo atualmente: a crise da alimentação, a crise energética e a crise ambiental. “Estas crises são mais profundas que a crise do dinheiro ou a crise desse modelo de capitalismo, porque está na base da produção”, explicou.

As soluções devem ser pensadas de maneira integrada, pois os problemas têm uma mesma matriz. Segundo ele, temos que mudar o modelo de produção capitalista: que privilegia as monoculturas, os insumos diretos e indiretos e a dependência dos derivados do petróleo, a petrodependência. “São elas que estão esculhambando o meio ambiente, temos que reverter esta lógica”, observou Frei Sérgio.

Por exemplo, o petróleo é o energético básico para a produção de alimentos, só é possível desmatar a Amazônia, porque se tem combustível para ir até lá, para mover as motosserras e transportar as madeiras, o efeito estufa é o resultado da emissão de gases na atmosfera produzidos pelas indústrias e automóveis.
“Temos que pensar a agricultura a partir daquilo que a natureza oferece. Repensar as cidades e a distribuição geográfica da população. Fazer a reforma agrária com a necessidade de produzir alimentos com preservação ambiental e com geração de energia local. Temos que reverter esta lógica e pedir para que os agricultores tradicionais e os índios nos ensinem a viver”, concluiu Frei Sérgio.

Mulheres também em luta por soberania alimentar e energética

A bióloga Cíntia Barenho, representante da Marcha Mundial das Mulheres, relatou as perspectivas da união entre a Marcha e as mulheres da Via Campesina. Os dois movimentos protagonizaram um encontro em Belo Horizonte (BH) no final de Agosto/2008, que reuniu mais de 500 mulheres para discutir o tema. “O que se pensa sobre soberania alimentar é o direito dos povos de determinar suas políticas de alimentos e não simplesmente suprir as demandas de exportação”, destacou.

No encontro de BH foram ressaltadas as necessidades de construir um novo modelo energético, que rompa com a petrodependência, que produza energia local, permita a participação da sociedade civil e contribua para a autonomia das mulheres. O encontro também foi uma forma de união entre os movimentos do campo e da cidade. “Para isto é necessário a construção de políticas públicas”, observou Cíntia.

A agricultura ecológica como modo de produção e de vida

O produtor ecológico integrante da Associação dos Produtores Ecológicos de Ipê (Apema), Vilmar Menegat, deu uma aula de vida, sobre o desenvolvimento deste “novo” modo de produção, que preserva o meio ambiente e produz alimentos saudáveis, no painel “Sementes Crioulas e a Preservação da biodiversidade”.

Há 20 anos, eles produziam individualmente e entregavam os produtos para os atravessadores, após, se organizaram na Apema e comercializaram os seus próprios produtos, os resultados e os benefícios foram de toda a ordem: “Hoje eu posso dizer que sou um agricultor e sou feliz”, destacou.

Vilmar falou de sua experiência de produzir ecologicamente, rompendo com a agricultura moderna, que produz somente um tipo de alimento. “Muitos diziam que este sistema de agricultura era do passado, mas na nossa propriedade temos uma bicharada e vários tipos de alimentos. A agricultura moderna se desfaz daquilo que é fundamental”, explicou Vilmar. Na propriedade onde ele mora com os seus pais, tudo o que é consumido é produzido ali e comercializado nas feiras ecológicas.

Outro cuidado que o agricultor tem é com a produção das suas sementes crioulas. “As sementes já tem tecnologia e cada tecnologia traz riscos. O desafio é que cada agricultor tenha suas próprias sementes. Por isto cuidamos da qualidade das sementes e dos grãos e investimos numa unidade de beneficiamento. São poucos os que produzem sementes crioulas”, relatou Vilmar.

A agricultura ecológica tem muitas variedades de produtos e por isto se está constantemente aprendendo com a natureza. “Por exemplo, hoje no mercado tem de tudo, mas temos que entender que os alimentos são produzidos no seu tempo, na sua época”. Além da produção de alimentos eles também estão investindo em bosques e florestas como forma de aumentar a biodiversidade do local.

Este trabalho desenvolvido em Ipê, além de alimentos também gera conhecimento e trocas de experiências, a propriedade do Vilmar constantemente é visitada e contabiliza mais de três mil pessoas de mais de 27 países diferentes.

A natureza é complexa

O extensionista rural e presidente da Associação dos Servidores da Ascar/Emater, Gervásio Paulus, falou sobre o aspecto cultural da “agricultura familiar de base ecológica”. “Eu sempre separo “Agri” de “cultura”, para mostrar que mais do que plantar, agricultura implica num processo cultural”. Ele citou o termo “biotecnologia”, que parece moderno, mas, no entanto é milenar, pois na Índia, na China e mesmo antes de Cristo já existia. “Nos últimos 40 ou 60 anos conseguimos poluir e causar mais erosão do que a agricultura milenar, porque o homem quis dominar a natureza”, destacou Gervásio.

Ele explicou que o processo da monocultura implica numa mudança cultural muito grande e antinatural, porque na natureza não existe a monocultura, existe a biodiversidade. “Nos enganamos com relação aos nossos paradigmas. Os ecossistemas naturais são complexos, precisamos construir agro sistemas parecidos com o ecossistema. A grande sacada da natureza para aumentar sua produtividade é a sua diversidade. Assim se uma espécie morre, existem outras. Por exemplo, não existe erva daninha, ou praga, estes são indicadores do estado do solo ou do meio ambiente. Os agrotóxicos ajudam a combater os efeitos que eles mesmos criam”, concluiu. Outro exemplo. “A floresta Amazônica não precisou de agrotóxico para se constituir no maior ecossistema. E o que estão fazendo? Estão desmatando para plantar na Amazônia e no nordeste que se poderia ter atividade de agricultura estão plantando floresta”

Redes de consumo para integrar o campo e a cidade

Para fechar os painéis da noite, o presidente da Cooperativa Girasol, Adair Barcelos, relatou o processo de construção de grupos de consumidores, que passaram a adquirir produtos naturais. “Primeiro montamos um grupo com compras mensais, depois semanais, depois conseguimos uma sede, e assim montamos uma rede de consumidores. “Começamos com a idéia que é possível ter um produto limpo e justo, onde não existe exploração do homem e da natureza e com a construção da cooperativa Girasol passamos para uma prática concreta de organização dos consumidores urbanos”.

A cooperativa demonstra que é possível construir um outro tipo de relação de produção e de comércio, onde os consumidores sabem o que estão consumindo, e ao mesmo tempo estão estimulando um sistema de produção também limpo, ecologicamente correto e ambientalmente sustentável.

Após os painéis os participantes fizeram perguntas e passou-se para a degustação dos produtos produzidos pelos agricultores ecológicos.
O desafio colocado por último é a necessidade de ampliar o processo de produção ecológica para se ter escala e assim os custos de produção e para o consumidor também ser acessível.

Foi destacado que assim como a agricultura convencional recebe subsídios e tem empresas como a Embrapa para estimular a produção, a agricultura ecológica também precisa de empresas e políticas públicas para que realmente possa ser acessível para a população e prime por um outro paradigma que não seja somente o lucro, mas sim a qualidade do produto e a manutenção e preservação do meio ambiente.

Por Luis Henrique Silveira/Engenho Comunicação e Arte

Um comentário:

Anônimo disse...

O Coletivo de Desenvolvimento Sustentável do Semapi, está de parabens, exercitando com fidelidade sua missão, articulando forças, debatendo com atores sociais temas importantes e, constituindo referência e acúmulo com sua base. Eta Sindicato que mais que fé, tem muita obra. ParaBENS!